quinta-feira, 5 de setembro de 2013

A vida de Cassilda




Cassilda tinha a uma vida à parte do mundo. Uma vida que ela considerava boa. Boa para ela.
Tinha ambições particulares e que não agregavam nem um pouco todas as outras pessoas. Era uma pessoa destemida. Que quando tinha vontade fazia, que quando desejava corria atrás, mas se esquecia de todos que estavam a sua volta. Esquecia-se do simples e do bonito para ir atrás de algo maior, muito maior do que se pode imaginar.
Focou-se tanto e tão intensamente em si mesma e em seus projetos, que aos poucos foi se esquecendo de que havia outras pessoas ao seu redor. E as pessoas aos poucos foram esquecendo que ela existia, também.
Alguns anos atrás, quando as pessoas ainda conseguiam enxergar Cassilda, quando ainda era pequena, era complicado fazer com que ela se interessasse por coisas novas. Tentaram levá-la ao parque. Mostraram todas as árvores que havia por lá, os troncos que se emaranhavam uns nos outros e como era legal subir neles. Cassilda pareceu nem notar. Mostraram-na a roda gigante e o frio que dá na barriga quando a gente está no topo do mundo inteiro. Cassilda desejava estar em casa imersa em sua existência reservada.
Depois de toda uma infância perdida, Cassilda arrumou um namorado que, assim como ela, gostava de ser sozinho. Eram sozinhos juntos de um modo tão monótono que se eu explicar é bem capaz de eu e você dormirmos antes que eu consiga terminar essa história.
Bom, de algum modo eles se aguentaram durante muitos anos e tiveram filhos. De alguma forma. E em nada os filhos de Cassilda se pareciam com ela ou com o pai.
Tentaram, assim como todos os outros tentaram inutilmente, mostrar à mãe um mundo novo por trás de sua própria vida. Descobriram sozinhos a gentileza e o bem que ela trazia, as brincadeiras em casa enquanto a mãe se prendia à alguma coisa que eles não entendiam bem. E puxavam a mãe pela barra das calças “Mãe, olha o castelo de cartas que eu construí!”. Depois de todos os gritos para chamar-lhe a atenção, quando ela enfim olhava, o castelo já havia desmoronado. Ela fingia algum interesse e se voltava para o que estava fazendo.  Mas não foi por falta de tentativa, que eles e todos no mundo acabaram por não nota-la mais. Já era tão comum o silêncio em casa e por onde ela passava que é como se Cassilda simplesmente não estivesse por ali.
E ela ia, pensando em si mesma, vivendo sua vida, seus trabalhos, suas ambições, suas suas suas coisas, que quando viu tinha pelancas.


E elas eram tudo que lhe restava.

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