quarta-feira, 27 de julho de 2011

Reflexos


Agora eu sou uma senhora de noventa e poucos anos, sentada na varanda do meu prédio, porque toda aquela fantasia de casinhas pintadas de cores fracas e jardins floridos não é a realidade de uma velha da minha idade. Venho aqui todos os dias e todos os dias me recordo de uma parte da minha vida. O vento bate na minha pele cansada de viver e o ar enche meus pulmões poluídos. Os cabelos brancos tomaram o lugar daquelas lindas ondas castanhas que eu tanto odiava, as rugas e as manchas do sol escondem a pele branca e sem defeitos que eu não me conformava em ter, e os corpos perfeitos que eu via na televisão e tanto desejava para mim, hoje é tempo que perdi enquanto tentava ser igual a todas aquelas mulheres.
Quando se tem noventa e poucos anos a única coisa que você quer é que não se esqueça do nome das pessoas da sua família, que sua dentadura não caia da boca e que sua coluna não resolva te matar de dor. Eu era tão linda. Nas fotos eu estava tão linda. Agora preço uma ameixa seca e tudo o que eu quero é ter mais algumas oportunidades nessa vida que me resta.
Dane-se a perfeição que eu procurava, só agora à beira da morte é que eu vejo que eu não deveria ter me importado tanto com a merda do meu corpo e do meu cabelo.
Fui uma mulher com tantas realizações... Tive dois filhos lindos, evoluí profissionalmente, um marido maravilhoso, amigos incríveis que estiveram comigo nos piores momentos da minha vida e fizeram os melhores momentos se tornarem inesquecíveis, e mesmo assim, passei a vida toda olhando para o espelho e achando alguma coisa que deveria mudar em mim.
Acho que o que mais me arrependo, depois de todos esses anos, foi ter me olhado tantas vezes naquele maldito espelho que só refletia as burrices que eu pensava, nada mais.

Caroline Linhares

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